O seguinte artigo é escrito por Arlindo Oliveira, Professor do IST e Presidente do INESC publicado originalmente na secção de Opinião da Executive Digest

Os preços do imobiliário têm subido rapidamente nos últimos dois anos, desde o início da pandemia. Levanta-se a questão se esta situação não deverá causar alguma preocupação e se não corremos o risco de repetir crises passadas causadas por bolhas do mercado imobiliário. No entanto, a situação atual é bastante diferente daquela que foi vivida no passado, e existem diversas explicações para a observada subida de preços. Embora exista uma subida acentuada dos valores das habitações isso não significa, necessariamente, que vivamos num contexto de bolha imobiliária, até porque estamos a enfrentar uma situação inflacionária, causada pela escassez de mão-de-obra, pelos problemas nas cadeias de abastecimento e pelas políticas monetárias adoptadas para combater a crise económica causada pelo Covid-19.

No caso concreto do preço da habitação, o preço dos materiais de construção tem subido por causa dos problemas nas cadeias globais de abastecimento e a escassez da mão-de-obra tem encarecido os custos de construção. Por outro lado, temos assistido a alterações nos padrões de uso das casas, com algumas famílias a precisar de espaços adicionais por causa dos confinamentos e outras a deslocarem-se para os subúrbios, aproveitando as novas possibilidades trazidas pelo teletrabalho.

Uma ferramenta muito útil para avaliar as alterações no mercado imobiliário português é o Índice de Preços Alfredo, desenvolvido por uma startup de inteligência artificial, com o nome do conhecido mordomo, criada por graduados do Instituto Superior Técnico. Este índice usa dados de diversas fontes para suportar avaliações objectivas dos preços das habitações, de acordo com as suas características específicas. Segundo os dados do INE, usados também por este índice, foram vendidos em Portugal este ano, até Setembro, mais de 153 mil imóveis, o que representa um aumento de 25% relativamente a igual período do ano anterior. Estes valores traduziram-se num valor de mercado de 24.9 milhares de milhões de euros, que compara com 18.7 milhares de milhões de euros no período homólogo de 2020. Isto faz com que 2021 tenha sido o ano mais forte de sempre do mercado imobiliário português. De acordo com a mesma fonte, no ano de 2021 o preço das casas nas principais cidades portuguesas subiu 5,7%.

Para o Fundo Monetário Internacional (FMI), Portugal ocupa o 8º lugar no ranking das subidas do imobiliário a nível mundial. Devemos, portanto, estar preocupados com a existência de uma bolha imobiliária em Portugal? Um dos dados importantes quando se analisa um mercado imobiliário é a taxa de esforço, a percentagem do rendimento total do agregado familiar destinada ao pagamento das prestações de créditos de habitação. De acordo com os dados do FMI, Portugal ocupa o 2º lugar no ranking do maior crescimento da taxa de esforço, só atrás do Luxemburgo. Um lisboeta, em média, tem que trabalhar cerca de 70 dias para comprar um metro quadrado na cidade de Lisboa. Faro e Porto ocupam o segundo e terceiro lugar, com taxas de esforço também elevadas.

A rapidez do crescimento dos preços das casas em Portugal, associado às elevadas taxas de esforço dos portugueses faz com que deva existir alguma cautela com a evolução futura dos preços do imobiliário. Isso é importante tanto para particulares, que verão as suas prestações futuras subir quando a inflação levar à subida das taxas de referência do banco central, como para as instituições financeiras que deverão avaliar de forma conservadora os valores dos imóveis que foram dados como garantia para os empréstimos contraídos pelas famílias. É improvável que continuemos a assistir ao crescimento dos preços ao mesmo ritmo a que assistimos nos últimos dois anos, e alguma estagnação ou mesmo correcção dos preços do mercado imobiliário são uma possibilidade real, que deverá ser acautelada por todos os envolvidos.